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Acesso ao crédito limita ganhos maiores em produtividade Divulgação

Acesso ao crédito limita ganhos maiores em produtividade Destaque

Escrito por  Jan 13, 2019

Caro pecuarista,


O nosso setor vive o desafio constante de aumentar a produtividade. Este é um dos pilares fundamentais para que a produção de carne bovina brasileira seja cada vez mais sustentável. Conheço várias propriedades rurais com níveis altíssimos de produtividade. No entanto, a média brasileira ainda é muito baixa: quatro arrobas por hectare, muito abaixo do potencial produtivo. Há vários fatores que explicam esta relativa baixa produtividade. O acesso ao crédito e à assistência técnica são dois fatores muito relevantes, como será melhor explicado.


Inúmeras vezes, os pecuaristas são colocados como os “vilões” e como os responsáveis pela baixa produtividade da cadeia. O produtor é visto como aquele que degrada, como aquele que não investe, ou, ainda, como aquele que prefere o modelo extensivo de produção. É fato que existem pecuaristas com este perfil. No entanto, conheço tanto pecuarista bom, dedicado, que ama o que faz e que quer fazer cada vez melhor. Então, o que impede um aumento mais rápido dos indicadores de produtividade?


Há algum tempo buscava responder esta pergunta. Então, no início deste ano tive a oportunidade de realizar um trabalho para a The Nature Conservancy (TNC), organização não governamental que, no projeto para Colaboração Floresta e Agricultura, busca atuar juntamente ao setor produtivo para apoiá-lo no desenvolvimento e implementação de modelos de negócios sustentáveis na pecuária. Em parceria com uma consultoria econômica, aplicamos dois questionários, um de perguntas de múltipla escolha e outro com perguntas abertas, com produtores e consultores do setor. O resultado foi incrível: os fatores institucionais, isto é, aqueles externos ao produtor, foram apontados como os grandes limitantes aos investimentos em produtividade. O acesso ao crédito é um deles.


O primeiro questionário foi respondido por quase 80 produtores de dez diferentes Unidades da Federação (UF). Daqueles que responderam, 23% possuíam até 500 cabeças de gado, 21% de 501 a 1000 cabeças e apenas 10% tinham mais que 5 mil cabeças. Sendo assim, pode-se concluir que a maior parte dos entrevistados entraria numa classificação genérica de médio produtor. A distribuição quanto ao sistema de produção (Cria, Recria-Engorda e Ciclo Completo) foi bem uniforme.


De todos os entrevistados, 56% afirmaram que, para aumentar a produção, precisariam aumentar a produtividade. Somente 4% alegaram que precisavam, exclusivamente, aumentar a área. Quando questionados sobre os fatores que limitavam os investimentos em produtividade, a dificuldade de acesso ao crédito apareceu em praticamente todas as respostas.


Além disso, 75% afirmaram conhecer outros pecuaristas que, por falta de crédito e excesso de burocracia para acessá-lo, não conseguiam melhorar seu manejo. Quando questionados sobre os fatores que dificultam ou impedem o acesso às linhas de financiamentos, 19% mencionaram a indisponibilidade de garantia legal, como a documentação da terra, e outros 19% afirmaram faltar planejamento por parte dos produtores. Apenas 13% sugeriram estar negativados por dívidas anteriores não cumpridas.


A questão das garantias está presente em áreas onde os produtores ainda não possuem a documentação da terra, como no caso da região norte do Mato Grosso. Na entrevista aberta, um dos pecuaristas afirmou já ter ido à capital do estado algumas vezes para tentar regularizar a situação, mas não teve sucesso.


Um dos resultados mais interessantes - que sustenta a hipótese de que os baixos índices de produtividade são consequência da falta de crédito para implementação de técnicas básicas de manejo é que 29% dos entrevistados afirmaram que, primordialmente, os investimentos obtidos nas linhas de crédito deveriam ser destinados ao manejo de pastagem. Além disso, 19% ressaltaram estratégias de suplementação mineral, proteica e proteica energética como fundamentais para incrementos em produtividade e 17% investimentos em genética.


Apesar desta consciência por parte dos entrevistados, um fator que chamou a atenção é que, atualmente, a maior parte do crédito adquirido acaba sendo destinado ao custeio e compra de matrizes. Nas entrevistas abertas, algumas lideranças afirmaram que isto se deve à dois fatores principais. O primeiro ao fato de o produtor “não saber por onde começar” e não possuir acesso à assistência técnica de qualidade que o oriente de maneira gradual. Alguns entrevistados ressaltaram que programas como o ABC, por exemplo, exigem dos produtores a compra de um pacote tecnológico “completo”, para o qual muitas vezes o produtor não está preparado.

O que algumas vezes acontece é que o produtor investe no manejo de pastagem. Depois, por falta de planejamento e experiência não possui recursos para comprar o gado para colher o capim, perdendo, assim, o dinheiro investido. Para os vizinhos, esta situação pode passar a percepção que a aquisição do crédito reflete em risco elevado de perda financeira.


Deste modo, iniciativas mais simples e com resultados iniciais mais modestos, como um calcareamento ou uma adubação leve, permitiriam um aprendizado gradual, mas efetivo, por parte do produtor e também da sua equipe. No médio prazo, outras tecnologias seriam implementadas.


A falta de planejamento estratégico foi o segundo fator apontado como explicativo para a obtenção do crédito para aquisição de matrizes. Conforme as entrevistas apontaram, a esmagadora maioria das propriedades não possui controle dos indicadores financeiros e zootécnico, inviabilizando um planejamento e estipulação de metas para o curto, médio e longo prazo.


O trabalho concluiu que o pecuarista tem buscado melhorar sua produtividade, mas a falta de recursos é um fator limitante. Ficou evidente que há espaços para novas linhas de crédito no Brasil, com menos burocracia, especialmente em regiões de fronteira onde a documentação da terra é um desafio. Para que a sustentabilidade da produção seja alcançada, é fundamental que estas linhas de crédito tenham um propósito específico e que seja proporcionado pela agência financiadora uma estrutura de planejamento estratégico e financeiro, além do suporte técnico.


Por fim, concluiu-se que para a pecuária acelerar seus passos em direção à uma produção mais sustentável são necessárias parcerias entre pecuaristas e outras instituições. Não basta apenas o pecuarista querer, como muitos já querem! É necessário acesso a financiamento e acompanhamento técnico para isto. Nesta entrevista, falo um pouco mais sobre o assunto.


https://www.scotconsultoria.com.br/noticias/tv-scot/49872/dificuldade-de-acesso-ao-credito-impede-aumento-de-produtividade.htm 


Agradecimentos: Gostaria de agradecer a todos os pecuaristas que, gentilmente, responderam o questionário. Em especial, gostaria de agradecer ao apoio do Grupo Pecuária Brasil e do BeefRadar, duas redes de contato das quais participo e que foram fundamentais para o grande número de respostas.


Quer saber mais sobre a TNC? A The Nature Conservancy (TNC) é uma organização global de conservação ambiental dedicada à preservação em grande escala das terras e água das quais a vida depende. Guiada pela ciência, a TNC cria soluções inovadoras e práticas para os desafios mais difíceis do mundo, para que a natureza e as pessoas possam prosperar juntos. Trabalhando em 72 países, a organização utiliza uma abordagem colaborativa, que envolve comunidades locais, governos, setor privado e outros parceiros. No Brasil, onde atua há mais de 25 anos, a TNC promove iniciativas nos principais biomas, com o objetivo de compatibilizar o desenvolvimento econômico e social dessas regiões com a conservação dos ecossistemas naturais. Saiba mais sobre a TNC em http://www.tnc.org.br.


[1] Perfil da Pecuária no Brasil - Relatório Anual de 2018, mensurado pela Athenagro, com base nos dados do IBGE, Lapig, Terraclass, Agrosatélite, Prodes e Map Biomas.

Fonte: Mariane Crespolini

Graduada em Gestão Ambiental pela Esalq/USP, mestre e doutoranda em desenvolvimento econômico pela Unicamp. É pecuarista na região norte de Mato Grosso. Pesquisadora, consultora e palestrante em temas relacionados à economia.

 

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